sexta-feira, 30 de março de 2012

Na terra das palavras abandonadas
Dos sonhos invisíveis
E da terra suja e molhada
Ouço um grito longínquo
Que me diz ser uma parte de mim!

Respondo com a minha ingenuidade
Mostro-lhe as minhas pétalas
E ergo-me sua escrava
Orgulhosa da minha condição!

Tento tocar-lhe
Mas ele diminui o seu volume
Foge pelo imaginário
E distancia-se da minha realidade!

Choro
Dou o meu próprio grito
Ouço-me novamente
E percebo que eu própria sou vários
Que nunca me deixarão sozinha!

A voz gelatinosa do além
Atravessa o sol sem derreter
A sua força tremida e brilhante
Capaz de ofuscar a luz
E reter a bravura
De quem a tenta condensar!

Sonhadora eficaz
Indecisa mas prudente
Volumosa e enchente
Dita as regras do destino
Sem vergonha nem receio
De não ser ouvida pelas estrelas!

Voz de todos os ninguéns
Cresce ao ritmo da precipitação
Da chuva que só é desejada 
Por quem nasceu na terra seca!

Teresa Poças

segunda-feira, 26 de março de 2012

Paleta

Quando a poesia não quer sair do casulo e buscar água à fonte,  não gosto de a tentar forçar a fazê-lo, porque ela é mais forte do que eu e seria impossível vencer essa luta! Por isso, neste dia menos florido deixo-vos com um dos meus poemas preferidos do mestre Albano Martins!

PALETA
Tens uma paleta
a que faltam
algumas cores. Talvez
porque há substâncias
a que não soubeste
dar expressão. Ou porque elas
são incolores. Ou porque
em toda a realidade
há fendas
que nem pela palavra
nem pela cor
alguma vez
saberás preencher.

Albano Martins, in "ESCRITO A VERMELHO"

domingo, 25 de março de 2012

Sonhando além do sonho

Sonho a sonho
Direciono a ilusão
De me criar além de mim
Definindo cada paragem
Sem lhes dar tempo
Para parar na sua própria realidade.

Sonho a sonho
Voo pelo vento violento
Da vontade de vandalizar
As probabilidades voláteis
De romper a vulgaridade
Do ar que respiro.

Sonho a sonho
Sonhando com o sonho
Mais distante do chão
Sonho com o sonho
Que nunca sonharei sonhar!

Teresa Poças

sexta-feira, 23 de março de 2012

Silêncio!
A palavra está a lutar contra a solidão
Rugindo com o vazio mais distante
Até chegar ao nosso redor
Sem trazer sílabas falantes.

Silêncio!
Qualquer sonoridade mais que afónica
Interfere na limpidez da verdade
Que foge de qualquer olhar
Mais que visto pelos olhos.

Silêncio!
Preciso de ouvir a tua alma
Sem que coloques à frente dela
Todo o pó que te faz ser
Mais do que aquilo que és.

Silêncio!
Estou à espera da esperança
De cantar o passado
Com a melodia do presente
E a letra de um futuro intocável.

Silêncio!
Deixem-me amar
Sem ter de dizer que amo!

terça-feira, 20 de março de 2012

Pisando a terra do infinito
Espero pelo futuro enquanto avanço
Sem congelar o tato com o presente
Que me parece mais distante
Do que o próprio fim.


Rasgo tudo o que outrora proferiu
Grito com todas as estrelas
Caio em todas as nuvens
Que me seguram a alma
Enquanto me deixam cair nos buracos.


Negros
Fundos
Gélidos
Vazios
Brancos
Curtos
Quentes
Saturados


Revejo-me perdida
Evaporo e fico
À espera do seu lado
Com mais força gravítica.


É aí que sumo
Já depois de morta!

segunda-feira, 19 de março de 2012

Devagar, devagarinho
Arrasto a minha fuga com medo de fugir.

Bem tento apressar-me
mas não consigo deixar para trás
O medo de seguir em frente.

Não gosto de me desviar
Mas já não suporto mais
Esta espera por me perder.

Vou acelerando, devagarinho,
E deixo para trás um pedaço de coragem
Que se multiplica numa pesada saudade
Até largar um pedaço de nada na última pedra.

É aí que paro.

Cabeça a minha que racionaliza os acasos
Tornando-os ilogicamente lógicos!

Para me perder resta-me apenas voltar atrás
Esperar pela perdição e fugir da fuga.

Qual fuga?
Digam-me qual fuga?

Não percebo porque me perco!

sábado, 17 de março de 2012

ponto e pronto

Sílaba a minha,
Como poderias pensar que eu precisaria de ti?
Aborreces-me com a tua sonoridade
Engasgas todas as minhas vontades
E rompes os meus segredos
Tornando-os coisas mais que reais!

Oh verso, não vale a pena caíres,
Não estou aqui para te apanhar
Tenho mais que fazer do que refletir
Acerca de algo que nem é meu
Quando o sol da primavera
Reflete a minha beleza nas águas
Do Inverno mais sombrio!

Sou mais forte do que essas palavras,
Cheias e vazias,
Quadradas e macias,
Que tanto dizem e deixam por dizer,
Àqueles que não criam a sua própria história.

Contos? Só memórias da minha vida
Tão suja que me deixa sempre algo por limpar,
Pedras por apanhar
Sonhos por construir.

Agora poemas?
Eu bem os deixo cair
Mas não
Não os apanho!

                                                                             (um heterónimo, talvez)

Cai.
Por favor,
Cai.
Estou à tua espera
E não te quero roubar.

Vá lá,
Larga as correntes malignas
Dos olhos penetrantes
Que pertencem a outrora
E deviam ser meus.

Cai.
Agora.
Agora mesmo.
Sei que te vou agarrar
Precisamente segura da minha precisão.

Vá lá,
Entrega-me o teu destino
Sem pensares na loucura
Da minha racionalidade
Precisamente insegura de precisão.

Cai.
Por favor,
Cai.
Só assim poderemos voar juntos!

E ele caiu...

Cansaço

Estou cansada
Do dia, da tarde e da noite,
Do tudo
Do mais que tudo
E do nada.

Estou cansada
De dormir e acordar
Sem sentir um novo dormir
E um novo acordar.

Estou cansada
Do ontem, do hoje e do amanhã
Como se o dia de ontem
não quisesse que o d’hoje fosse parar no amanhã.

Não seria melhor vivermos um só dia
Um ato único
Uma fonte sem calhaus,
Um só respirar
Mas para sempre?

Ajoelhava-me perante o destino
Pedindo-lhe que não se destinasse
E ficasse parado na passagem do mesmo instante.

Tudo pareceria novo,
Refrescado
Valioso
E eu não estaria cansada!

Teresa Poças

domingo, 11 de março de 2012

Ciclo Invertido

Nos últimos tempos, a sociedade tem caminhado à procura de uma vida digna de o ser. O marketing entrou em força nas nossas vidas e obrigou-nos indiretamente a querer ser mais para ter mais. Logo aí podemos verificar a inversão da ordem natural das coisas. Não deveríamos querer ser mais, simplesmente, e sermos recompensados se o conseguíssemos? Acontece que as pessoas perceberam que a vida funciona quase ciclicamente e pensaram que poderiam chegar ao meio começando pelo fim. Não posso dizer que estavam enganadas de todo, porque na verdade um ciclo é um ciclo e por isso não tem princípio, meio nem fim. Na verdade, o que temos tentado fazer é inverter o ciclo, como uma criança que resolve um labirinto ao contrário. Porquê? É mais fácil. Prevemos os obstáculos. Temos mais conhecimentos. Não parece existir a possibilidade de perder e por isso, sentimo-nos superiores ao próprio jogo!
Reparem bem, muitas vezes...
 1º - Em vez de elogiarmos os outros por eles serem nossos amigos, elogiamos os outros para eles se aproximarem de nós.
2º - Em vez de percebermos que para termos poder de compra, temos de produzir, achamos que só conseguimos produzir se houver poder de compra.
3º - Em vez de balançarmos os extremos, caímos no extremo do equilíbrio.
4º - Em vez de a fama ser atingida graças ao dom de cantar, só se consegue mostrar ao mundo esse dote, que muitas vezes não é considerável, se formos famosos. 
5º - Em vez de ganharmos dinheiro por trabalharmos, só arranjamos esse trabalho se a nossa família tiver dinheiro.

Ora, parece-me que estamos perante um grave problema, porque quem fica de fora do ciclo quando merece um lugar no pódio acaba por se posicionar e tirar o lugar a todos estes falsos atores.
1º - Uma amizade proveniente de elogios falsos nunca poderá ser verdadeira.
2º - O poder de compra necessita de algo que o sustente, porque comprar pagando com nada implica deixar de comprar, porque o vendedor não irá conseguir produzir.
3º - Viver em busca do equilíbrio extremo obriga-nos a recuar para compensar demasiados avanços e a estagnação retira valor à vida.
4º - Se esse dom for apenas exposto devido à fama, acaba por destruí-la.
5º - Não conseguimos o respeito de quem nos contrata e acabamos por seres meros objetos de troca.

Não vejo nenhuma solução a não ser questionar os nossos próprios paços e certificarmo-nos de que para além de nos pertencerem, fazem parte dos nossos sonhos, mesmo que sejam errados. Basta amar por amar e não querer mais amor do que aquele que se ama, por não ser possível alcançá-lo!

sábado, 10 de março de 2012

Todas as bolas redondas batem nas paredes

A vida é uma daquelas coisas do tipo complicadas. Achamos que somos o sol e que ela é um planeta principal à nossa volta e depois acabamos por rezar a uma força que nem sabemos bem se existe a pedir para sermos um planeta secundário quando já não há nada a fazer para impedir a nossa queda num buraco negro. Somos qualquer coisa, sim não tenho dúvidas, mas será que basta isso para nos afirmarmos como seres vivos? Canalha é aquele que achar que sim ou então outro qualquer que concorde que não só por aceitar todas as coisinhas que lhe parecem uma espécie de arte divina que não pode ser questionada! Vamos lá ver, o que seria da arte se não fosse questionada? Faria sentido a própria essência do questionamento não aceitar ser vítima da crítica? Um quadro escondido da alma da dúvida morre no momento em que foi pintado! É triste saber da quantidade de vezes que isto já foi dito e ainda assim não é cumprido. Peço desculpa, não sou ninguém para falar, afinal estou a exigir que duvidem, impedindo-vos de duvidar da minha própria exigência! Meu caro mundo que criaste a sociedade, diz-me porque é que isto é tão complicado?
Não quero ser diferente, mas sim ser nada, pois essa é a única forma de viver. Não posso aceitar uma definição para mim mesma e utilizá-la como veículo para a minha vida em sociedade. Isso é o mesmo que uma tangerina já morta e caída no chão ser empurrada por todos os ventos e tempestades durante 5 anos e depois acabar na boca de um qualquer animal até se desfazer e não deixar rasto. O ser humano cai muitas vezes da árvore, perde a ligação com os ramos, esquece-se das flores que o procriaram e do tronco que segura toda a sua família. Acha-se mais importante por estar no topo, porque pensa que a partir dele a queda é mais demorada, esquecendo-se de que é o primeiro a levar com a chuva e o granizo das tempestades que ninguém controla, a menos que Deus exista e possa ser considerado alguém, o que me parece impossível visto que todos os alguéns são controláveis.
Se eu sou diferente? Não, a única coisa que distingue a minha igualdade é a minha perspetiva de a ver. Essa sim está longe de ser igual. Os meus sonhos não fazem parte das respostas possíveis aos questionários, os meus lábios não beijam paredes, os meus olhos não estão ligados à minha alma, as minhas mãos recusam-se a escrever o que lhe pedem, os meus ouvidos não filtram o que não lhes convém, o meu olfato é atraído pelos subúrbios e o meu infeliz coração arrecada tudo aquilo que o meu cérebro lhe transmite. Não filtrar, significa não ser, não ser leva-me a mudar, mudar faz-me sentir viva, estar viva enche o meu coração e um coração cheio tem um destino previsível: Ataque cardíaco! Ah? Que raio de estupidez é esta? Agora tenho de me seguir pelas leis da natureza? É que se sim, estou desgraçada com a sua ciclicidade. Viver leva à morte, mas não viver significa não sair da morte da vida! Estou louca só pode e já estou a mudar completamente de ideias. Provavelmente, o melhor será continuar morta e não querer fazer parte desse ciclo, porque irei parar ao mesmo! Não me vou dar ao trabalho de sair deste sofá confortável onde posso aceder a todos os mundos fantásticos que acabam no início ou no fim ou no meio do ciclo da vida, se é que um ciclo tem extremidades, e me dão espaço para pensar que depois de um final feliz tudo o resto é mais que cor-de-rosa. Sozinha vou perder-me sem se quer aproveitar a beleza de estar numa esplanada a tomar café. A minha única solução é esperar pelo amor que dizem andar por aí e pelos ares em vez de fugir da minha conduta. Afinal, não é isso que todos fazem? E até tem corrido bem, certo?!?!? Pois, realmente...

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