E os dias acabam sempre assim:
Um templo de saudade
Daquilo que não aconteceu
Como queríamos
sábado, 22 de fevereiro de 2014
vácuo
Os peões andavam de um lado para o outro acelerados
Os carros apitavam involuntariamente sem razão
Ouviam-se repetidamente “bom dias” cansados
Conversas meteorológicas, perguntam-se as horas
Até que surge uma discussão sobre a moralidade
(das personagens da novela) na paragem do autocarro
Ou um resumo das tragédias noticiadas na noite anterior
Acompanhado pelos típicos lamentos da vida!
“A gente não pode
fazer nada!”
“É a vida!”
“Anda-se uma vida toda a trabalhar para acabar nisto”
“Tanta gente que não fazia cá falta e tinham de escolher
este”
“Perdoe-Me, Deus lá sabe o melhor para nós”
Pois sabe.
Chega mais um sujeito.
Mais um bom dia.
“Acho que o tempo vai abrir à hora de almoço” – diz
Só o velho, a alma mais vulnerável presente, responde
“Foi o que eu li no jornal”
Neste mundo, é preciso estar em baixo para ser-se simpático
(ou revoltado, depende)
O autocarro nunca mais chegava
Trocavam-se olhares monótonos e sem expressão
As cabeças encostavam-se ao vidro da paragem
Não se via um sorriso
Nem entusiasmo
Nem afeto!
“O autocarro deve estar perto”
Disse uma sopeira, olhando para o relógio pela décima vez
Mexia o pé constantemente, passava a mão pela tez enrugada
Ajeitava o cabelo, a volta de prata que levava ao pescoço e
a saia que lhe ia caindo,
Mulher ansiosa, sem entusiasmo nem vida, estava ansiosa por
nada!
Onde estariam os seus filhos? O que fazer para o jantar?
Para onde teria ido o marido?
...Há dez anos atrás
“A vida tem coisas más” - palavras sábias da velha
justificando o excesso de dramatismo do episódio da noite anterior – “Mas há
males que vêm por bem”
A conversa com a mulher de meia idade já ia na terceira
novela da noite
E termina com algo como: “Eles lá sabem o que vai
acontecer!”
“Alguém gravou a novela da sic de anteontem para ver ontem durante
a tarde?”
Não há interferência sonora, mas há quem abane a cabeça na
horizontal.
“Estranho! Tanta gente a perder a novela... Já ninguém me
quer aturar” – pensamento mais sábio do dia e desta vez não era um ditado.
O autocarro chega.
(A paragem estava vazia)
Pessoas entram!
terça-feira, 18 de fevereiro de 2014
domingo, 16 de fevereiro de 2014
ParadoxalMente
as palavras são demasiado curtas
para dias tão compridos
e, mesmo assim,
tudo o que faz a diferença
ficou por dizer
ou achamos que dissemos
por outras palavras
enigmática esta arte
de dizer o que não se disse
por outra maneira de o dizer
para dias tão compridos
e, mesmo assim,
tudo o que faz a diferença
ficou por dizer
ou achamos que dissemos
por outras palavras
enigmática esta arte
de dizer o que não se disse
por outra maneira de o dizer
sábado, 8 de fevereiro de 2014
lá
Eles acham que se vingam em falar mal
E que me magoam com palavras que não ouço
Mas que pairam no ar e estragam a minha memória!
Eles acham que eu sofro por não estar lá
E por não me poder defender dos dentes mal lavados,
Dizendo que não disse que disse,
Ou que disse o que não disse ou disse e nem me lembro!
Acreditam que mesmo sem puder ver nem ouvir
Sinto as más energias que depositam no meu nome
E choro tempestades noturnas,
Com a esperança de acordar alguém
Ou entrar nos sonhos de um pobre inocente!
Eles acham que não aguento o peso do arrependimento,
E que daria tudo por uns segundos extra
Em que me ajoelharia perante eles, suplicando perdão.
Eles acham tudo o que queriam que fosse
Mas não sabem o que é a morte!
Não sabem que estou lá em cima, no paraíso,
Um lugar onde tudo é eternamente novo!
Eles é tão distante e pequeno,
Que não dói.
E que me magoam com palavras que não ouço
Mas que pairam no ar e estragam a minha memória!
Eles acham que eu sofro por não estar lá
E por não me poder defender dos dentes mal lavados,
Dizendo que não disse que disse,
Ou que disse o que não disse ou disse e nem me lembro!
Acreditam que mesmo sem puder ver nem ouvir
Sinto as más energias que depositam no meu nome
E choro tempestades noturnas,
Com a esperança de acordar alguém
Ou entrar nos sonhos de um pobre inocente!
Eles acham que não aguento o peso do arrependimento,
E que daria tudo por uns segundos extra
Em que me ajoelharia perante eles, suplicando perdão.
Eles acham tudo o que queriam que fosse
Mas não sabem o que é a morte!
Não sabem que estou lá em cima, no paraíso,
Um lugar onde tudo é eternamente novo!
Eles é tão distante e pequeno,
Que não dói.
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